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Artes Visuais

JOSE IGNACIO REVERENCIA A NATUREZA E AS DIVINDADES AFRICANAS

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As obras do artista chile-baiano Jose Ignacio Suarez Solis ou simplesmente Jose Ignacio têm uma pulsação que nos impulsiona ao campo da contemplação e do espanto. Suas pinturas nos encantam pela harmonia das cores e as esculturas algumas pela sensualidade e as mais recentes pelo impacto que causam nas pessoas.Conversarmos sobre sua trajetória artística e de imediato senti através da sua voz que era uma dessas pessoas que está transbordando energia para criar e gosta de dialogar sobre sua arte. Pode servir de exemplo para alguns artistas não tão talentosos quanto ele e que ficam se esquivando por razões que prefiro não abordar. Quando terminamos a nossa conversa me escreveu uma mensagem que ouso publicar: “Muito obrigado pela visita de hoje. Me senti diante de alguém que queria realmente entender algo a respeito da complexidade que forma parte de um indivíduo que decide contra toda prova em contrário, acreditar na arte como o caminho da redenção do espírito humano! Foi uma Educação. Arq. Ignacio Solis”.

Pinturas em acrílica sobre tela onde o artista mostra habilidade e criatividade ao se inspirar nos bambus que povoam o entorno do seu ateliê

Não estou diante de um criador aleatório, mas consciente com base no arcabouço intelectual que acumulou através dos anos em suas andanças pelo exterior e sua formação de arquiteto. Seus pais deixaram Cuba na década de 1960 e foram para a cidade de Valparaíso, no Chile, porque seu pai Daniel Solis era engenheiro mecânico e administrador e ficou encarregado de acompanhar a construção de vários hotéis da cadeia Sheraton na América Latina. E foi exatamente no Chile que nasceu em vinte e quatro de novembro de 1967 o Jose Ignacio. Aconteceu que seu pai saiu da empresa do grupo Sheraton e foi trabalhar na Fundação Ford como professor de Economia. Em 1970 a família desembarcou no Brasil passando pelo Rio de Janeiro, São José dos Campos, em São Paulo e finalmente a Bahia onde se estabeleceu. Do Rio de Janeiro tem poucas lembranças apenas que ficava da janela do apartamento no bairro do Botafogo admirando a formação do Pão de Açúcar. Vieram morar na Ladeira da Barra, em Salvador-Ba e quando jovem recorda que pescava e nadava com seus amigos que moravam nos bairros da Barra, Graça e no Corredor da Vitória nas águas que contornam a escarpa que limita todo o trajeto do local. Disse Jose Ignacio que naquele tempo encontrava alguns pescadores profissionais e amadores e poucos que se aventuravam. Hoje o local se transformou num parque público com centenas de pessoas frequentando diariamente nadando, pescando, andando de caiaques, barcos a vela e a motor, de pranchas de Surf Soft board e praticando outros esportes náuticos.

Ori Guerreira Tamoya, acrílica sobre tela, de 2022

Todo o seu tempo de estudante foi no Colégio Antônio Vieira, que fica no bairro do Garcia, em Salvador-Ba. Porém, em 1986 decidiu juntamente com seu pai que queria viajar e assim foi morar no estado da Virgínia Ocidental ou West Virginia, nos Estados Unidos, que fica na chamada Costa Leste. É um dos cinquenta estados americanos e foi colonizado pelos britânicos e depois por outros povos que vieram da região do Mar Báltico. Diz a Wikipedia que “A Virgínia se estende desde a Baía de Chesapeake até os Apalaches, com um longo litoral no Oceano Atlântico. Ela é uma das 13 colônias originais, com monumentos históricos como Monticello e a famosa plantação de Charlottesville, do pai fundador Thomas Jefferson. O Assentamento de Jamestown e Colonial Williamsburg são museus de história viva que reencenam a vida das eras colonial e revolucionária.” Disse Jose Ignacio que é o estado mais pobre dos Estados Unidos e lá ele ficou na casa de seu padrinho Miguel Rourra, que era porto-riquenho e trabalhava numa das minas de carvão. Lembra que as pessoas andavam ostensivamente armadas e que seus padrinhos eram pobres. Também seu padrinho era de poucas palavras e que esta sua permanência na Virginia lhe serviu muito como aprendizado de vida. Passou por Nova Iorque e Syracuse em 1987. Morou em 1990 em Copenhague e estudou na University of Copenhagen, teve contato com o desenho e a aquarela, começando a produzir jornais de croquis, quando conheceu os costumes e a cultura dos escandinavos, e destacou que eles valorizam muito o fazer com as mãos. “Todas essas informações que vivenciei por onde passei estão dentro de mim e isto me ajuda a criar as minhas obras. Por exemplo o cuidado que tenho quando estou realizando uma pintura ou escultura e este amor em trabalhar com minhas mãos”, disse Jose Ignacio. Em seguida escolheu estudar arquitetura nos Estados Unidos exatamente em Oregon, na Universidade do Estado de Oregon que fica na Costa Oeste. Fez sua primeira exposição em Oregan em 1992, e em 1993 se formou em arquitetura.


“O seu primeiro projeto arquitetônico foi a casa de seus pais na encosta da Baía de Todos os Santos, em 1991. Em 1994, o artista instalou‐se numa fazenda de café na Chapada Diamantina onde desenvolveu a prática do desenho e da pintura com maior regularidade. Frequentador do ateliê de Carybé, foi influenciado pela prática escultórica envolvendo o uso de ferro batido. Como arquiteto, José Ignacio foi gerente de projetos no setor hoteleiro, realizando diversos trabalhos juntamente com seu pai por toda América Latina ‐ o que lhe permitiu o aprimoramento de sua pesquisa e uma maior circulação de sua obra, integrando coleções particulares espalhadas pelos lugares em que habitou. Em 2004 fez residência artística em Helsinki, Finlândia, ressignificando o uso de sua paleta.

O escultor Jose Ignacio armando Iemanjá com seus assistentes

EXPOSIÇÃO DE PINTURAS

Voltou para a Bahia trabalhou com arquitetura desenvolvendo alguns projetos e começou a pintar. Em 2019 fez sua primeira exposição de pintura na Bahia e deu um nome sugestivo “Dentro do Mato na Borda do Mar, no Centro Cultural da Caixa Econômica Federal, em Salvador-Ba com curadoria de Alejandra Muñoz. O artista Jose Ignacio escreveu este poema que está inserido no seu portfólio: “O verde que eu vejo em cores. / Exercício cotidiano da natureza viva dentro de uma Urbis metropolitana brasileira. / Licuris são autóctones. Bambus e coqueiros, não./ Mas minha pele respira essas peles, esses troncos dos quais me aproprio erudita e popularmente./ Mimetismo impresso em grafismos de cores que vibram./ Contemplações de primeira viagem, ‐ sempre aspiro o sublime./ De uma touceira de bambus, extraio um espaço eterno./ Extraio esse espaço instantâneo da fugacidade no tempo de nossa existência./ Quero texturas que pulsem e vibrações que desestabilizem./ Busco um ritmo descontrolado de pinceladas, cheio de energia para ir e vir./ O convencional pode ser inquietante e o aleatório, um desafio./ Me permito seduzir por este espaço que quer ser sereno, mas muitas vezes claustrofóbico./ Eu, nômade./ Nessa síntese formal entre planos de luz, troncos e folhagens.”

Jose Ignacio com duas esculturas em seu ateliê na Vila Brandão, em Salvador-Ba

Falei de nome sugestivo porque o ateliê de Jose Ignacio fica na Vila Brandão que é um enclave de moradias localizadas na encosta entre o Largo da Vitória e o Yatch Clube da Bahia. Portanto em plena encosta onde temos uma faixa de densa de vegetação e o mar. Ele me mostrou um jacarandá e um jatobá que plantou e estão vigorosos com mais de três metros de altura e copas frondosas. Quando fui ao seu ateliê o Jose Ignacio me recebeu no Largo da Vitória e seguimos num jipe Suzuki numa verdadeira aventura de poucos minutos. É que para se chegar ao galpão que compõe o seu ateliê temos que percorrer uma pequena estrada com piso de cimento em estrias horizontais para que o carro não patine. É uma ladeira apertada, muito íngreme que lembra àquelas montanhas russas onde as pessoas vão alegres e no trajeto começam a gritar desesperadas de medo. Confesso que fiquei apreensivo enquanto ele dirigia fazendo curvas fechadas e olhando do meu lado direito a pirambeira que se descortinava a cada curva. Felizmente o trajeto é curto. Só pensava se o carro iria conseguir subir no retorno. Felizmente saímos sãos e salvos. Ufa!
Falando de sua exposição de pinturas Alejandra Muñoz escreveu: “A exposição Dentro do Mato, na Beira do Mar” apresenta uma fartura das telas que contém um processo de desmontagem das formas que conhecemos para instaurar uma dimensão diferente do visível. Fragmentos de coqueiros, licuris e bambus vemos grafismos que podem evocar uma escrita. A sintaxe que resulta do processo da pintura é um texto não verbal. Os ritmos do gesto da pincelada e a composição dos intervalos entre formas podem ser apreendidos como uma partitura de harmonia inaudíveis, uma melodia que apenas o artista em seu fazer escuta, mas que pode nos fazer ouvir nosso interior.”

Ori Guerreira na Luz, escultura feita com madeira , ferro batido e pedras do mar

MOSTRANDO SUAS ESCULTURAS

Na exposição que fez em 2023 também no Centro Cultural da Caixa Econômica Federal em Salvador intitulado Oris Tupinambás além das esculturas também mostrou algumas pinturas da sua produção recente. Mas com certeza o que causou mais impacto foram as esculturas representando as divindades africanas que são os Oris que ele criou com suas cabeças de pedras coletadas na beira mar da praia que contorna a escarpa do Corredor da Vitória onde tem o seu ateliê. Para fazer as cabeças bastaram alguns troncos de madeira , pequenos cortes nas pedras e noutras apenas posicionar sobre as velhas engrenagens de máquinas industriais ou domésticas e mesmo de veículos que ele utiliza para dar forma às suas esculturas, cortando, soldando e lixando num trabalho além de criativo que exige também muita disposição física.
Nesta mostra a Ticiana Lamego escreveu: “Sua linguagem inicial é bidimensional, a pintura acrílica em tela, observando as matas que resistem na Cidade. Troncos de licuris, folhagens, touceiras de bambus. Organicidade e geometria numa paleta vívida que anseia romper barreiras e transitar por esferas de outros ritmos, por um habitar de outros anos. A vegetação é tema constante para o artista e ela surge aqui como elemento de ressignificação. Introduzindo agora a figura humana com marcante protagonismo, suas pinturas anunciam um ato antropofágico em que, por fim, a carne vira mata e a mata vira carne. Homem-e-mata e mata-e-homem se tornam parte de um mesmo corpo. Ainda que a sua relação com a história e a memória se dê de forma rigorosa, Jose Ignacio anseia um diálogo aberto o suficiente no sentido de honrar uma existência e ao mesmo tempo rematerializar outras permanências. Um cacique tupinambá, uma guerreira goitacá, uma chac-mool Maya. Qualquer distância entre eles deixa de fazer sentido. Todos habitam o universo onírico de Jose Ignacio.”

Ori Guerreira Tupinambá feita com madeira,bronze e ferro batido, 2018-2023

Voltando a trajetória artística de Jose Ignacio depois das pinturas ele desembarcou no mundo da escultura e sua primeira experiência foi criar um panteão com a representação das entidades do candomblé chamadas de Ori, que é uma palavra do Yoruba que significa cabeça, o espírito, a sabedoria. Daí ele fez suas esculturas compostas de peças que consegue nos ferros velhos da Cidade. Disse com orgulho que conhece todos os ferros velhos e vai procurando e separando as coisas que lhes interessam. Enquanto as cabeças foram feitas deste grupo de esculturas com pedras que recolhe na praia que fica na borda da encosta. São esculturas muito pesadas e quando visitei a sua última exposição no ano passado em companhia do professor da Faculdade de Arquitetura, da Universidade Federal da Bahia, Marcelo Silva, ficamos intrigados como o Jose Ignacio conseguiu colocar nas salas àquelas esculturas que tinham algumas que pesavam mais de uma tonelada. Foi quando a indagar durante a entrevista como ele conseguia transportar suas esculturas pesadas do ateliê para o local da exposição ou mesmo para entregar a colecionador o artista revelou que as peças são encaixadas de tal forma que podem ser removidas e recolocadas como um jogo de armar. Para evitar que ocorra alguma mudança o Jose Ignacio costuma desenhar suas esculturas e assim vai seguindo um script. Outras vezes ele confia na sua intuição criativa, no seu olhar e vai armando peça por peça de acordo com sua visão estética. Presenciei ele e seus assistentes terminando de armar uma escultura de madeira e ferro que ele denominou de Iemanjá. A obra tem numa das extremidades um pedaço de tronco de madeira que lembra a cauda da Rainha do Mar e mede mais de dois metros de altura. Para armar é um verdadeiro quebra cabeça porque tudo tem que estar ajustado como imaginou o artista. Ele me disse que está trabalhando com esta escultura há quase um ano até chegar neste ponto que presenciei.

Pinturas do artista dos Oris africanos.

Falando de sua rotina de trabalho artístico disse que todos os dias levanta cedo e vai para seu ateliê. Cada vez mais está se dedicando às suas esculturas, mas que recebeu recentemente uma proposta para trabalhar no Paraguai gerenciando a obra de um complexo hoteleiro que será construído e ele decidiu passar uma temporada no país vizinho. De repente volta a falar de como é envolvente o trabalho escultórico e que este envolvimento intelectual também exige muitas vezes esforço físico. É verdade, o Jose Ignacio é um homem alto e forte e vi o esforço que empreendia para manipular e encaixar as pesadas peças de ferro em sua Iemanjá. Assisti até o momento que foi colocada a cabeça, que é uma peça de ferro arredondada. Ficaram faltando alguns ajustes, a limpeza e o lixamento de algumas peças que compõem a escultura.

Ao fundo a obra que fez inspirado na Divina Comédia, de Dante Alighieri

Durante nossa conversa ele falou algumas vezes sobre uma pintura que fez e está logo atrás de sua mesa no ateliê que representa os juizes da Cúria Romana que julgaram com severidade o Dante Alighieri exilando e confiscando os bens do autor da famosa Divina Comédia. O Jose Ignacio disse que foi ler a obra e ficou encantando porque com poucas palavras o autor deu personalidade e vida aos seus algozes. Foi então que pintou o quadro em vermelho lembrando da cor do Inferno que a obra épica trata através de seus versos rimados. É uma obra famosa da literatura universal de fantasia escrita no início do século XIV que trata das vissistudes do ser humano.
Falando do mercado adiantou que o mercado baiano não o recebeu bem até agora, mas que tem conseguido vender suas obras para o sul do país, principalmente para o mercado paulista graças às postagens que faz nas redes sociais. Mantém contatos com colegas arquitetos que indicam suas obras para seus clientes. Disse que a maioria dos colecionadores é composta
de pessoas jovens que ascenderam intelectualmente e financeiramente e assim entendem e apreciam a sua arte. Geralmente eles têm casas na Bahia, e gostam de manter contato direto com o artista e também conseguem estabelecer uma empatia e até com isto conseguem comprar por um preço mais acessível, justo.

Escultura Almira feita de madeira, pedra do mar e ferro.2022-2023

Quando lhe perguntei como se sente diante da reação das pessoas ao olhar uma de suas esculturas que não têm normalmente uma forma conhecida e não são facilmente palatáveis por leigos. Ele contou que fica feliz quando vê pessoas espantadas diante uma de suas obras. “Eles dizem: Ignacio não estou entendendo nada! O que é isto? E completam geralmente dizendo que estão gostando. Este espanto e essas indagações dos espectadores lhes deixam satisfeito. Explicou que não se trata de medo, e sim de espanto e que isto é fruto do impacto que as suas esculturas causam nas pessoas. Isto para ele é muito salutar porque mexeu com a sensibilidade das pessoas e assim este questionamento tende a causar interesse pela obra de arte.

Escultura Almira feita de madeira, pedra do mar e ferro.2022-2023

EXPOSIÇÕES

INDIVIDUAIS: 2023 – Caixa Cultural Salvador, Bahia; 2019 – Caixa Cultural Salvador, Bahia ; 2006 – Galeria Norton Helsinki, Finlândia ; 2004 – Galeria Art &Design Helsinki, Finlândia; 2003 – Sala de Arte Bahiano, Salvador Bahia e em 1998- Galeria ACBEU, Salvador-Bahia
COLETIVAS – 2023 – Galeria Pivô; 2004 – Galeria Art &Design Helsinki,Finlandia;2002- Bienal do Recôncavo, São Felix, Bahia ;2000- Salão Regional de Artes Plásticas de Porto Seguro; 1999- Associação Latino Americana, Pelourinho, Salvador, BA ; 1997- Bienal do Recôncavo, São Felix, Bahia;1996- Universidade Católica de Santiago, Chile; 1992- Universidade do Oregon, USA. Ao lado Escultura Ori Guerreira Tupinandacaru II,madeira pedra do mar e chapa de zinco. 2019-2023.

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