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Artes Visuais

SÉRGIO RABINOVITZ RESILIÊNCIA CONTEMPORÂNEA

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Por Reynivaldo Brito

“Percorro as minhas telas com a ansiedade do grafiteiro que percorre os muros da Cidade”. Esta frase está num pequeno texto que o artista Sérgio Rabinovitz escreveu quando em determinada época tentou definir a sua arte. Hoje maduro continua com a mesma disposição de ocupar os amplos espaços de suas telas ou de outro suporte com a mesma disposição e visão contemporânea de quando chegou depois de estudar dois anos em Nova Iorque e morar mais por um outro período. Sua arte é acima de tudo gestual, gráfica, aquela coisa do preto e branco que entrou na sua alma de artista e permanece até hoje e isto identifica a sua obra, a sua linguagem e a forma como ele conta as suas histórias e se expressa livremente. Aproveitou para visitar muitos museus, frequentar galerias, viu importantes exposições e cruzou nas ruas com gente famosa como Andy Warhol, John Lennon e outras pessoas que moravam naquela grande metrópole cosmopolita. Tem a resiliência e a teimosia do seu povo que mesmo enfrentando condições adversas sempre luta para continuar e vencer os obstáculos que surgem durante a sua existência. Sérgio Rabinovitz é filho de pais judeus. Conheci seu pai Salomão Rabinovitz quando estava no jornal A Tarde e ele de quando em vez aparecia com um texto e uma foto sua ou da Orquestra Sinfônica da Universidade Federal da Bahia anunciando um novo concerto. Ele era o spalla, ou seja, o primeiro-violino da orquestra. O que fica ao lado do maestro e dá aqueles solos belíssimos enquanto os demais músicos e plateia escutam silenciosos a sua apresentação. Depois tornou-se Diretor da Orquestra e tocou pelos mundo afora com importantes maestros. Conheceu sua esposa Dora Fichman também graças à música porque ela era violinista na Orquestra Sinfônica no Rio de Janeiro onde ele era um dos violinistas e tiveram três filhos homens.

O artista é natural de Salvador e fez seu último ano do primário na Escola Israelita, que funcionava no Campo da Pólvora, e depois foi para o Colégio de Aplicação, que era vinculado a Faculdade de Filosofia da UFBA, que ficava no prédio onde hoje funciona o Ministério Público, na Avenida Joana Angélica. Nesta época funcionavam vários cursos neste prédio, inclusive foi lá que me tornei bacharel em Jornalismo e depois em Ciências Sociais. Era um dos baluartes da resistência contra as medidas autoritárias do regime militar. Seu pai que era uma pessoa muito conhecida no seio da universidade e nos meios artísticos baianos decidiu lhe apresentar a Calazans Neto. Foi no ateliê de Calá, no bairro de Itapuã, em Salvador, que ele teve os primeiros contatos com uma prensa e as ferramentas da xilogravura. Ficou alguns anos até que o Calá vendo que já aprendera tudo que podia ensinar e orientar lhe aconselhou a procurar Mário Cravo Junior e passar um tempo por lá em seu ateliê-oficina. Foi então que o Salomão, sempre um pai presente, o acompanhou devidamente armado com um bilhete de recomendação do mestre Calazans Neto. O Mário Cravo, para os que tiveram o privilégio de conhecer não era muito de agrados e mostrou-lhe uma velha prensa totalmente suja e ocupada com pedaços de ferro, e outros objetos e restos de materiais, e disse mais ou menos assim. “Se você conseguir limpar pode ficar ali trabalhando, só não me encha o saco”. Sérgio não perdeu tempo e passou a retirar toda aquela sujeira e tudo que não tinha utilidade até que a prensa ficou limpa e em condições de funcionamento. Ali trabalhou e silêncio e conviveu com o maior escultor baiano de todos os tempos e aprendeu muito. Enquanto trabalhava de quando em vez o mestre Mário Cravo Júnior dava uma rápida olhada e sugeria alguma coisa para enriquecer a obra. Nesta prensa e ambiente frequentaram grandes artistas de renome nacional e até internacional como Oswaldo Goeldi, o grande mestre da xilogravura; Henrique Oswald e outros. O trabalho no ateliê de Mário Cravo era muito intenso e assim o Sérgio não ousava interrompê-lo, deixava que ele se manifestasse quando bem entendia. O Sérgio Rabinovitz chegou a fazer o vestibular e frequentar por um período o curso de Física na Universidade Federal da Bahia. Mas a arte era mais forte e terminou abandonando a Física.

Capa da Constituição da Bahia de 1989 de autoria de Sérgio Rabinovitz


NOS ESTADOS UNIDOS

E assim ficou no ateliê de Mário Cravo até que em 1976 recebeu uma bolsa da Fundação Fulbrigth que tem um programa de intercâmbio educacional e cultural do governo dos Estados Unidos com outros governos, e está aqui no Brasil há mais de setenta anos. Foi criada em 1946 por lei do senador J.William Fulbright. Vários artistas baianos, escritores e outros intelectuais já foram beneficiados por esta instituição americana. Foi estudar numa das principais universidades de arte a The Cooper Union for the Advancement of Science and Art, mais conhecida como Cooper Union na cidade de Nova Iorque.

Sérgio diante dos livros e catálogos de sua trajetória

Porém antes passou uma temporada em Connecticut, na universidade Wesleyan que tem uma das mais importantes coleções de gravuras do mundo. É uma universidade privada de artes liberais e conhecida popularmente como a Universidade Wesleyana e foi fundada em 1831. Lá ele pode conhecer de perto gravuras dos principais artistas de todo o mundo e teve grandes mestres. Estudou com o professor Paul Sides, que foi um dos desenvolvedores da tinta acrílica, e não patenteou sua invenção. Lembra da emoção em ver e pegar em gravuras dos grandes mestres da arte universal. Depois veio para New York estudar na Cooper Union que é uma “escola construída com base em um novo modelo radical do ensino superior americano, baseado na crença fundamental do fundador Peter Cooper de que uma educação “igual às melhores escolas de tecnologia estabelecidas” deve ser acessível a quem se qualificar, independentemente de sua raça, religião, sexo, riqueza ou status social e deve ser “aberto e livre para todos”. O próprio fundador da Cooper cunhou uma frase “Ser livre como o ar e a água”, Hans Haacke professor alemão de arte conceitual, krishna Redy de gravura. E completa Sérgio Rabinovitz “a Cidade de Nova Iorque por estar morando lá já é um grande aprendizado para a vida”. Foi neste período que o Mário Cravo Neto, fotógrafo, filho do escultor Mário Cravo Junior , resolveu passar uma temporada em Nova Iorque e lá eles saiam para fotografar a cidade, seus personagens e tudo que lhes interessavam. Lembra Sérgio que foi um período muito rico e cada vez mais abrir seus horizontes artísticos. Quando voltou para o Brasil já estava usando o papel como suporte não para fazer gravura e sim para pintar. Fez muitos trabalhos em pintura todos dentro de uma visão de arte contemporânea com muito grafismo. Sua arte é o resultado, segundo mesmo se expressou de uma conjunção de várias linguagens como a gravura em metal, em madeira, a litografia, dentre outras e fiquei com aquela força do preto e branco e do grafismo dos grafites que se multiplicavam nas paredes e muros da cidade americana.

Sérgio, Carolyn sua esposa, João Osmário, Jorge e Zélia Amado no lançamento do livro de Jorge com duas ilustrações do artista

Sérgio Rabinovitz nasceu em Salvador na antiga Maternidade Promatre, que ficava quase defronte ao Colégio da Bahia ou Central, na Avenida Joana Angélica. Nesta época seus pais Salomão e Dora Fichman moravam no Rio de Janeiro onde trabalhavam na Orquestra Sinfônica. Quando Dora ficou grávida e chegou a hora de ter a criança decidiu que teria que ser na Bahia onde moravam seus pais. Portanto, Sérgio Rabinovitz nasceu em Salvador no dia 17 de dezembro de 1955. Depois já estavam no Rio de Janeiro seu pai ganhou uma bolsa de estudos para estudar violino na Áustria com um grande mestre desse instrumento. Foi assim que receosos de levar um bebê para a Áustria decidiram deixar com os avós que residiam num prédio na Rua do Paraiso, no bairro de Nazaré, em Salvador. Por coincidência seus avós maternos e paternos moravam no mesmo prédio, e assim a ausência dos pais foi de certa forma preenchida pelos avós. Ao retornarem da Áustria um ano depois seus pais o levaram para o Rio de Janeiro onde permaneceu até os onze anos de idade. Lá estudou na Escola Israelita Brasileira Eliezer Steinbarg Max Nordau, que funciona no bairro de Laranjeiras, no Rio de Janeiro. Ao completar onze anos vieram para Salvador e ele foi estudar no Colégio de Aplicação até concluir o ensino médio e fazer vestibular para Física na Universidade Federal da Bahia.

Na obra Ciclistas vemos a fluidez dos traço que marcam sua pintura

Quando voltou em 1979 dos Estados Unidos fez sua primeira exposição na Associação Brasil-Estados Unidos – ACBEU, na época a Bahia tinha um consulado americano sediado aqui, e promovia muitas exposições e outras atividades culturais importantes. Fez duas exposições no Museu de Arte Moderna da Bahia, sendo uma quando ainda estava nos Estados Unidos e o diretor era o Sylvio Robatto. A outra quando retornou e o diretor era Francisco Liberato. Sua quarta mostra foi no Museu do Carmo, espaço criado por José Pedreira. O decorador e crítico de arte baiano nascido na ilha de Itaparica em 1923 José de Souza Pedreira na época Diretor do Museu de Arte da Bahia onde permaneceu de 1979 a 1981, que fica no Corredor da Vitória, em Salvador. Ele é autor do livro de contos Rosa da Noite, com belos desenhos de Carybé, e foi ele quem providenciou esta exposição para o jovem Sérgio Rabinovitz apresentar suas últimas criações.
De lá para cá vieram várias exposições e momentos de vitórias importantes na vida artística de Sérgio Rabinivitz. Mostrou no seu ateliê a pegadas das suas caminhadas no fazer arte. Numa das imensas mesas vi vários pedaços de pano morim onde ele faz seus desenhos e depois transfere para as telas. Antes ele faz uma camada com gesso, dá uns riscos gestuais para depois de pronta a base passar a transferir as imagens para a tela. Aí entra um esforço físico maior porque tem que pressionar bem para que a tinta transpasse o tecido de morim e se fixar na tela.

Observamos o equilibrio das formas abstratas e das cores usadas nesta obra

Trabalha tanto que tem exposições prontas de pintura, de desenhos e gravuras que nunca foram mostradas. Tem recebido pessoas em seu ateliê onde tem uma home gallery onde suas pinturas estão todas dispostas em painéis móveis que podem ser apreciadas com mais conforto e boa visualização. Me mostrou uma grande quantidade de madeira que utiliza para fazer os chassis de suas telas. Compra panos de vela de barco de qualidade e assim constrói as telas onde vai fazer suas pinturas. Diz que está mais desapegado e que tem passado algumas temporadas nos Estados Unidos, especialmente no estado do Oregon, onde mora um de seus filhos e está tentando criar um ponto de ligação entre suas atividades aqui e lá. Se mostrou preocupado com a situação de nosso país e espera que o Brasil consiga passar por todas estas dificuldades e crises para que possamos viver com mais tranquilidade neste país abençoado por Deus.

COMO DIFINE SUA ARTE

E pra encerrar transcrevo o pequeno texto que o Sérgio me enviou com este bilhete:
“Bom dia amigo. Sua visita me pôs a meditar sobre trajetória,caminhos,definições e achei este pequeno texto que escrevi há alguns anos creio bem define a mim e minha obra. Espero que possa somar a nossa conversa.” Vejamos:

Rabinovitz define a arte que faz há décadas.
“Meus trabalhos são bastante espaciais, e neles procuro um grande impacto visual, tratando essencialmente do cotidiano por uma visão abstrata e espontânea, revelando uma realidade que estimule o espectador a participar ativamente, construindo também a sua realidade sobre a minha visão de artista. Vejo a pintura, essencialmente, como registros de passagem, da passagem do tempo e do espaço, registro da passagem do homem sobre a terra e da sua ação transformadora, da passagem de um indivíduo e de sua visão do mundo e do homem ao seu redor. Percorro minhas telas com a ansiedade do grafiteiro que percorre os muros da cidade. Escutando o tempo na contemplação das inscrições futuras. Assim me faço pintura. A visão percorrendo o estreito espaço entre o real e o imaginário, entre a parafernália visual moderna e a mais remotas e ancestrais lembranças, o gesto herdado de quando só falávamos ao redor do fogo. Pintura, gesto, ação, o momento, a vida que se revela a cada instante”.

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